sexta-feira, 27 de setembro de 2013

A via amarela na política brasileira

Apesar de ser o verde a cor central das sete do arco-íris, a milenar sabedoria chinesa sempre se refere ao ponto de equilíbrio de qualquer situação como a via amarela, pois essa cor é a que se vê no centro daquele fenômeno natural, portanto a que seria mais imparcial e sábia. De fato, apesar de termos conhecimento das sete cores do arco-íris, o que normalmente vemos nesse fenômeno é o amarelo central, um degradê de azul de um lado e um de vermelho de outro, portanto os antigos - e bota antigo nisso! - chineses tinham razão ao pintar o caminho do meio de amarelo.
Eis aí a explicação do título desse artigo. E, ao me referir à via amarela na política, não pretendo focar o espectro ideológico de esquerda, centro e direita, mas sim uma via racional e que possa dar pelo menos uma pincelada de lógica a essa barafunda que é o quadro político-partidário hoje no Brasil.
Teoricamente os partidos políticos devem representar os anseios da população de um país, portanto seriam concebidos sobre linhas ideológicas defendidas por alguma parcela, maior ou menor, dos cidadãos. No nosso caso, no entanto, haja ideologia para diferenciar a conduta programática de trinta e dois partidos políticos!
Se seguissem a cartilha teórica, teríamos partidos de extrema-esquerda, esquerda, centro-esquerda, centro, centro-direita, direita e extrema-direita. Já são sete. Considerando novas possibilidades, como prega o ex-prefeito de São Paulo Gilberto Kassab, cujo partido (PSD) ele define como não sendo de esquerda, nem de centro, nem de direita, muito antes pelo contrário, talvez devêssemos ter alguns outros posicionamentos, quem sabe extremo-alto, alto, centro-alto, centro-baixo, baixo e extremo-baixo. Bem... já conseguimos treze, embora fosse bastante difícil para um partido político se definir como extremo-baixo, seja lá o que isto pudesse significar, mas tentemos dar uma lógica ao pensamento político atual.
Acrescentemos aí os coloridos, solidários, quem sabe os modernos e os religiosos, como o Verde, o Solidariedade, a Rede e os cristãos - não tenho conhecimento de nenhum partido budista ou umbandista, mas não perdemos por esperar. Vermelho não vale porque tradicionalmente essa cor identifica a esquerda.
No entanto, ainda é bastante difícil tentarmos alocar os 32. Mas, me diga aí: quais seriam as diferenças ideológicas da população que poderiam justificar tal prodigalidade de representações? A rigor, desde a redemocratização do país e, principalmente após a Carta de 1988, apenas uma partido político exibia uma linha claramente ideológica: o PT. Mas o verbo não foi colocado no passado ali atrás por descuido. EXIBIA! Bastou assumir o poder, e lá se foram todos os dogmas partidários. Aliás, antes mesmo disso, pois, para chegar ao poder aliou-se a várias outras correntes, e repudiou muitas das suas principais pregações históricas.
Portanto, a meu ver, todas as discussões de reforma político-partidária que se arrastam no Congresso são pura perfumaria. Financiamento de campanha? Uns defendem o financiamento público, pelo Estado, outros o financiamento privado mas, qualquer que seja a linha, ninguém diz que nada disso acabaria com o caixa dois. Financiamento público, então, é um despautério! Só serviria para perpetuar o poder nas mãos de quem o detém. Votação nominal, ou votação em lista fechada? Mais uma loucura de todo tamanho! Vamos agora transferir aos donos de partidos o direito de nos dizer quem devemos eleger.
Se não fizermos nada para alterar esse quadro, em breve deveremos ter tantos partidos políticos que o horário gratuito de propaganda em rádio e TV - mais uma estultice - sufocará a programação normal de todas as emissoras.
E existe um remédio simples para essa câncer político: cláusula de barreira! Qualquer cidadão com os direitos políticos em dia poderia fundar uma partido político. Sequer seria necessário falsificar quase meio milhão de assinaturas, com hoje é praxe, para obter o seu registro. Junte-se aí meia dúzia de interessados em cada Estado, e pronto. Mais um partido político estaria apto a disputar os votos dos eleitores. No entanto, no dia seguinte ao da proclamação dos resultados finais da eleição, caso ele não tivesse conseguido arrebanhar 2%, 3%, ou 5% de representação, estaria formalmente extinto. Somente os Enéas - alguém aí se lembra dele? - da vida aventurariam-se a fundar partidos como quem cria uma ONG.
Portanto, sob minha ótica, o ponto central da discussão de reforma político-partidária sequer está sendo cogitado e, a depender de nossos congressistas, certamente nunca serão. Afinal, é bastante difícil identificar um político brasileiro no caminho amarelo!

segunda-feira, 23 de setembro de 2013

A posição do meio

O voto do ministro do Supremo Celso de Melo, acatando o direito aos embargos infringentes de doze dos condenados no processo do mensalão, e assim desempatando a favor dos réus a decisão final, certamente desagradou a grande maioria dos brasileiros, que desde o início do julgamento e, principalmente ao final dele, quando o Supremo resolveu condenar os culpados independentemente de suas posses, proximidade do Poder e custo dos advogados, começaram a acreditar que a Justiça no Brasil passaria a ser a mesma para todos, e não draconiana com ladrões de galinha e leniente com os poderosos e/ou ricos (será que existe rico sem poder, ou poderoso pobre?).
No entanto, não podemos deixar de reconhecer que o ministro ateve-se estritamente aos termos da Lei. Com o conhecimento e erudição que lhe sobram, traçou um histórico da legislação do país desde o Império, passando por todas as Cartas Constitucionais e Emendas que já nortearam o Direito no Brasil, sempre demonstrando, de forma incontestável, a constante presença daquele direito. Como golpe final, descreveu a tentativa do Governo Fernando Henrique Cardoso de extingui-lo de nossa Lei que, no entanto, foi rejeitada pelo Parlamento. Portanto, se rejeitada a sua extirpação do Código, o direito subsiste.
Pela sua impecável biografia, nunca poderíamos atribuir ao ministro Celso de Melo intenção outra que não a estrita observância da Carta Magna, afinal é sabido que ele nunca se deixaria levar à posição de Ministro da Defesa, como fez Lewandowski, ou deixaria transparecer sua contrariedade ao condenar um ilustre criminoso, com fez o novato Luis Carlos Barroso, a quem, por sinal, acusam de ter recebido R$ 2 milhões para assumir sua cadeira no Supremo (http://www.portali9.com.br/noticias/denuncia/bomba-no-stf-ministro-novato-recebeu-r-2-milhao-do-governo-federal).
Como, a critério de Celso de Melo, todo juiz deveria ser, ele ateve-se à tecnicalidade da Lei, à frieza e isenção com que todos os códigos legais devem ser apreciados, deixando claro que não se curvaria à pressão popular para que decidisse ao contrário, pois essa atitude representaria um rompimento da Justiça e um cerceamento aos direitos dos réus.
Pois bem. Então, ao invés de nos indignarmos com mais um explícito exemplo de impunidade, um enorme e certeiro incentivo à corrupção e à tentativa de enfraquecimento, ou mesmo de destruição, da Democracia utilizando seus próprios meios, devemos tecer loas ao brilhante e irretocável voto do ministro? Cego pela tecnicalidade, agrilhoado às frias interpretações das leis escritas e tolhido de seu próprio sentimento, a meu ver, o ministro esqueceu-se que, antes de mais nada, a função primordial da Suprema Corte é FAZER JUSTIÇA. Se ela é a derradeira porta a que se pode bater quando se imagina ter um direito subtraído, sua função só pode ser a de preservação da Justiça, ser a última palavra nesse sentido.
Nesse caso, então, optando por não suprimir aos réus um direito que, mesmo sendo sabidamente abusivo, pois somente serve para postergar uma decisão já tomada em última instância, ou a uma virada de jogo trocando-se os jogadores como as substituições de atletas em partidas esportivas, estava (ou está) registrado nos Códigos Penais, não maculou o ministro o sagrado direito que toda uma população tem de exigir que seus extorsivos impostos não sejam desviados por gatunos, e sim utilizados para a melhoria da qualidade de vida no país?
Se a alegação de que o direito aos embargos infringentes é imexível, pois o Parlamento, a quem a Constituição atribui o direito de legislar, não o derrubou, se amanhã o Congresso decidir que parlamentares são absolutamente inimputáveis, o Supremo terá de engolir?
Se não podemos ombrear Celso de Melo a um Ministro da Defesa como Lewandowski, apesar de toda a sua ilustre biografia, erudição, isenção e conhecimento das Leis, tampouco poderíamos atribuir-lhe alguma qualidade de lembrasse, mesmo de longe, o Rei Salomão.
Ele fica mesmo aí nesse meio, sendo mais um nessa nossa triste história de impunidades, leniências e injustiças, legais e sociais.