segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

Poder Institucional, o Quarto Poder

A Democracia Representativa pode ser considerada como a forma de exercício do Poder que mais aproxima as ações de Governo às aspirações populares. No entanto, dada a complexidade do mundo moderno, podemos constatar que o exercício desse Poder pelos três pilares básicos da democracia, os poderes Judiciário, Legislativo e Executivo, são diariamente confrontados com situações que acabam mesmo por descaracterizar a própria Democracia.
Na Venezuela, por exemplo, o presidente Hugo Chávez utilizou-se dos próprios mecanismos democráticos à sua disposição para subjugar o Legislativo e o Judiciário, e abocanhar cada vez mais poder, tornando-se um verdadeiro ditador.
Ok. A América Latina nunca foi mesmo um exemplo de democracia, mas o que dizer dos Estados Unidos? Pois o grande guardião da Democracia no mundo, há pouco tempo nos deu um dos maiores exemplos de ações antidemocráticas, ao permitir, e até incentivar, que a NSA espionasse não só suspeitos, ou pretensamente suspeitos, mas a população inteira não só de seu país, mas de tantos outros, inclusive aliados, aí incluídos os próprios mandatários desses Estados. Esse deslize democrático foi possível a Barack Obama em decorrência das alterações legais pós onze de setembro de 2011, como instrumentos de luta contra o terrorismo, e a elas se apega o Executivo daquele país para justificá-lo perante seu povo e o mundo.
No Brasil, temos hoje uma impressão de que os mensaleiros, que, constatado por alguns ministros do Supremo Tribunal Federal, pretendiam dar um golpe institucional para perpetuar uma facção no poder, estão presos e desarticulados, mas se observarmos bem de perto, veremos que, por meios diferentes, os objetivos dos atuais governantes continuam os mesmos.
Esses exemplos, sem que sejamos obrigados a exercícios de memória para buscarmos outros tantos, são suficientes para mostrar que a Democracia está precisando de cuidados. Preservar a Democracia, em última instância, é preservar as instituições democráticas. Se elas funcionam a contento, por maior que seja o poder de um executivo, legislador ou jurista, sempre haverá um limite que ele nunca poderá transpor.
Muito se fala hoje no Brasil sobre reforma política mas, apesar de ser sobejamente sabido que nosso sistema político atual só incentiva a corrupção e a ineficiência, é mínima a expectativa de que haja uma mudança séria e profunda, que aproxime os representantes do povo aos seus anseios. Pelo contrário, o que podemos observar é um movimento em direção ao financiamento público de campanhas, o que será novamente um mecanismo democrático sendo utilizado para perpetuar o poder.
Estamos a poucos dias do início de um ano eleitoral, no qual gostaríamos de ver não o conchavo político de sempre para angariar maior tempo de propaganda gratuita na TV, mas sim o debate aberto e amplo de ideias para que o Brasil realmente avance. Como seria o Brasil, sob a ótica dos postulantes à presidência, dentro de 20, 30 anos? O que fazer para alcançar essas metas?
Mesmo sabendo ser um completo desvario, pois além de representar uma mudança de tal calibre que acredito ninguém teria a coragem de abraçar, tenho cá também minhas dúvidas quanto à sua factibilidade, mas, como a internet é um território livre (tá bom, nem tanto, mas é o meio mais livre de que dispomos), ouso aqui dar um pitaco sobre uma alteração que, acredito, poderia melhorar a Democracia: a criação de um quarto poder, o Poder Institucional que, a exemplo do Supremo Tribunal Federal, que tem por dever a manutenção e proteção da Constituição, teria sob sua égide a proteção e manutenção das instituições democráticas.
Esse quarto Poder teria sob sua responsabilidade todos os órgãos controladores, tais como as agências reguladoras, como ANAC, ANVISA, etc, a Controladoria Geral da União, a Polícia Federal, O Banco Central, e outras tantas instituições que minha ignorância sequer me deixa saber que existem, mas que fazem parte das tão necessárias e preciosas instituições democráticas. Seria da alçada desse Poder Institucional zelar para que todos esses órgãos não recebessem indicados políticos, mas somente quadros competentes e de carreira, de forma a que realmente exercessem seu papel, como diria Collor de Mello, duela a quién duela.
A meu ver, o voto direto não seria a melhor forma de compor os quadros desse Poder, pois ele acabaria por receber os mesmos vícios que contaminam Legislativo e Executivo, mas apenas numa aparente contradição, seria o caminho natural. Seriam habilitados a integrar o Quarto Poder todos os ex-presidentes, após um segundo mandato, consecutivo ou não, os quais passariam a ser inelegíveis a quaisquer outros cargos públicos, mesmo que a Vereador. Também seriam automaticamente habilitados os Senadores após o exercício de um terceiro mandato. Também esses, assim como todos os outros que seriam habilitados, poderiam ter exercido o cargo consecutivamente ou não, e também passariam a ser inelegíveis. Os ministros do Supremo Tribunal Federal e do Supremos Tribunal de Justiça também seriam automaticamente habilitados, após sua aposentadoria ou após o exercício do cargo por oito anos, a seu critério. Deputados Federais, após o exercício de cinco mandatos também comporiam o Quarto Poder. A exemplo do Supremo Tribunal Federal, o Poder Institucional teria que criar suas próprias regras de funcionamento, mas deveria existir uma cláusula que impedisse um segundo mandato ao seu líder máximo, que deveria exercer essa liderança por apenas dois anos.
Quem sabe o Executivo, antes de submeter uma Medida Provisória ao Congresso, a devesse submetê-la ao Poder Institucional, que teria um curtíssimo prazo para deliberar sobre sua pertinência ou não. Ah. Na verdade existem tantas outras atividades que esse Quarto Poder deveria desenvolver, mas novamente a minha ignorância sobre os meandros políticos e do poder me impedem de enumerar. No entanto, por mais absurda que seja, fica aí a minha ideia.
Será que vale a pena debatê-la?

sexta-feira, 27 de setembro de 2013

A via amarela na política brasileira

Apesar de ser o verde a cor central das sete do arco-íris, a milenar sabedoria chinesa sempre se refere ao ponto de equilíbrio de qualquer situação como a via amarela, pois essa cor é a que se vê no centro daquele fenômeno natural, portanto a que seria mais imparcial e sábia. De fato, apesar de termos conhecimento das sete cores do arco-íris, o que normalmente vemos nesse fenômeno é o amarelo central, um degradê de azul de um lado e um de vermelho de outro, portanto os antigos - e bota antigo nisso! - chineses tinham razão ao pintar o caminho do meio de amarelo.
Eis aí a explicação do título desse artigo. E, ao me referir à via amarela na política, não pretendo focar o espectro ideológico de esquerda, centro e direita, mas sim uma via racional e que possa dar pelo menos uma pincelada de lógica a essa barafunda que é o quadro político-partidário hoje no Brasil.
Teoricamente os partidos políticos devem representar os anseios da população de um país, portanto seriam concebidos sobre linhas ideológicas defendidas por alguma parcela, maior ou menor, dos cidadãos. No nosso caso, no entanto, haja ideologia para diferenciar a conduta programática de trinta e dois partidos políticos!
Se seguissem a cartilha teórica, teríamos partidos de extrema-esquerda, esquerda, centro-esquerda, centro, centro-direita, direita e extrema-direita. Já são sete. Considerando novas possibilidades, como prega o ex-prefeito de São Paulo Gilberto Kassab, cujo partido (PSD) ele define como não sendo de esquerda, nem de centro, nem de direita, muito antes pelo contrário, talvez devêssemos ter alguns outros posicionamentos, quem sabe extremo-alto, alto, centro-alto, centro-baixo, baixo e extremo-baixo. Bem... já conseguimos treze, embora fosse bastante difícil para um partido político se definir como extremo-baixo, seja lá o que isto pudesse significar, mas tentemos dar uma lógica ao pensamento político atual.
Acrescentemos aí os coloridos, solidários, quem sabe os modernos e os religiosos, como o Verde, o Solidariedade, a Rede e os cristãos - não tenho conhecimento de nenhum partido budista ou umbandista, mas não perdemos por esperar. Vermelho não vale porque tradicionalmente essa cor identifica a esquerda.
No entanto, ainda é bastante difícil tentarmos alocar os 32. Mas, me diga aí: quais seriam as diferenças ideológicas da população que poderiam justificar tal prodigalidade de representações? A rigor, desde a redemocratização do país e, principalmente após a Carta de 1988, apenas uma partido político exibia uma linha claramente ideológica: o PT. Mas o verbo não foi colocado no passado ali atrás por descuido. EXIBIA! Bastou assumir o poder, e lá se foram todos os dogmas partidários. Aliás, antes mesmo disso, pois, para chegar ao poder aliou-se a várias outras correntes, e repudiou muitas das suas principais pregações históricas.
Portanto, a meu ver, todas as discussões de reforma político-partidária que se arrastam no Congresso são pura perfumaria. Financiamento de campanha? Uns defendem o financiamento público, pelo Estado, outros o financiamento privado mas, qualquer que seja a linha, ninguém diz que nada disso acabaria com o caixa dois. Financiamento público, então, é um despautério! Só serviria para perpetuar o poder nas mãos de quem o detém. Votação nominal, ou votação em lista fechada? Mais uma loucura de todo tamanho! Vamos agora transferir aos donos de partidos o direito de nos dizer quem devemos eleger.
Se não fizermos nada para alterar esse quadro, em breve deveremos ter tantos partidos políticos que o horário gratuito de propaganda em rádio e TV - mais uma estultice - sufocará a programação normal de todas as emissoras.
E existe um remédio simples para essa câncer político: cláusula de barreira! Qualquer cidadão com os direitos políticos em dia poderia fundar uma partido político. Sequer seria necessário falsificar quase meio milhão de assinaturas, com hoje é praxe, para obter o seu registro. Junte-se aí meia dúzia de interessados em cada Estado, e pronto. Mais um partido político estaria apto a disputar os votos dos eleitores. No entanto, no dia seguinte ao da proclamação dos resultados finais da eleição, caso ele não tivesse conseguido arrebanhar 2%, 3%, ou 5% de representação, estaria formalmente extinto. Somente os Enéas - alguém aí se lembra dele? - da vida aventurariam-se a fundar partidos como quem cria uma ONG.
Portanto, sob minha ótica, o ponto central da discussão de reforma político-partidária sequer está sendo cogitado e, a depender de nossos congressistas, certamente nunca serão. Afinal, é bastante difícil identificar um político brasileiro no caminho amarelo!

segunda-feira, 23 de setembro de 2013

A posição do meio

O voto do ministro do Supremo Celso de Melo, acatando o direito aos embargos infringentes de doze dos condenados no processo do mensalão, e assim desempatando a favor dos réus a decisão final, certamente desagradou a grande maioria dos brasileiros, que desde o início do julgamento e, principalmente ao final dele, quando o Supremo resolveu condenar os culpados independentemente de suas posses, proximidade do Poder e custo dos advogados, começaram a acreditar que a Justiça no Brasil passaria a ser a mesma para todos, e não draconiana com ladrões de galinha e leniente com os poderosos e/ou ricos (será que existe rico sem poder, ou poderoso pobre?).
No entanto, não podemos deixar de reconhecer que o ministro ateve-se estritamente aos termos da Lei. Com o conhecimento e erudição que lhe sobram, traçou um histórico da legislação do país desde o Império, passando por todas as Cartas Constitucionais e Emendas que já nortearam o Direito no Brasil, sempre demonstrando, de forma incontestável, a constante presença daquele direito. Como golpe final, descreveu a tentativa do Governo Fernando Henrique Cardoso de extingui-lo de nossa Lei que, no entanto, foi rejeitada pelo Parlamento. Portanto, se rejeitada a sua extirpação do Código, o direito subsiste.
Pela sua impecável biografia, nunca poderíamos atribuir ao ministro Celso de Melo intenção outra que não a estrita observância da Carta Magna, afinal é sabido que ele nunca se deixaria levar à posição de Ministro da Defesa, como fez Lewandowski, ou deixaria transparecer sua contrariedade ao condenar um ilustre criminoso, com fez o novato Luis Carlos Barroso, a quem, por sinal, acusam de ter recebido R$ 2 milhões para assumir sua cadeira no Supremo (http://www.portali9.com.br/noticias/denuncia/bomba-no-stf-ministro-novato-recebeu-r-2-milhao-do-governo-federal).
Como, a critério de Celso de Melo, todo juiz deveria ser, ele ateve-se à tecnicalidade da Lei, à frieza e isenção com que todos os códigos legais devem ser apreciados, deixando claro que não se curvaria à pressão popular para que decidisse ao contrário, pois essa atitude representaria um rompimento da Justiça e um cerceamento aos direitos dos réus.
Pois bem. Então, ao invés de nos indignarmos com mais um explícito exemplo de impunidade, um enorme e certeiro incentivo à corrupção e à tentativa de enfraquecimento, ou mesmo de destruição, da Democracia utilizando seus próprios meios, devemos tecer loas ao brilhante e irretocável voto do ministro? Cego pela tecnicalidade, agrilhoado às frias interpretações das leis escritas e tolhido de seu próprio sentimento, a meu ver, o ministro esqueceu-se que, antes de mais nada, a função primordial da Suprema Corte é FAZER JUSTIÇA. Se ela é a derradeira porta a que se pode bater quando se imagina ter um direito subtraído, sua função só pode ser a de preservação da Justiça, ser a última palavra nesse sentido.
Nesse caso, então, optando por não suprimir aos réus um direito que, mesmo sendo sabidamente abusivo, pois somente serve para postergar uma decisão já tomada em última instância, ou a uma virada de jogo trocando-se os jogadores como as substituições de atletas em partidas esportivas, estava (ou está) registrado nos Códigos Penais, não maculou o ministro o sagrado direito que toda uma população tem de exigir que seus extorsivos impostos não sejam desviados por gatunos, e sim utilizados para a melhoria da qualidade de vida no país?
Se a alegação de que o direito aos embargos infringentes é imexível, pois o Parlamento, a quem a Constituição atribui o direito de legislar, não o derrubou, se amanhã o Congresso decidir que parlamentares são absolutamente inimputáveis, o Supremo terá de engolir?
Se não podemos ombrear Celso de Melo a um Ministro da Defesa como Lewandowski, apesar de toda a sua ilustre biografia, erudição, isenção e conhecimento das Leis, tampouco poderíamos atribuir-lhe alguma qualidade de lembrasse, mesmo de longe, o Rei Salomão.
Ele fica mesmo aí nesse meio, sendo mais um nessa nossa triste história de impunidades, leniências e injustiças, legais e sociais.